Protótipo de biossensor pode contribuir para diagnóstico de câncer
06/05/2021

O manuscrito publicado na revista Chemistry of Materials destaca, entre outras características, a eficiência e a versatilidade do protótipo da plataforma de biodetecção desenvolvido por pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), uma organização social do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).

O artigo descreve a criação de uma plataforma eletroquímica especialmente estruturada para monitorar com exatidão e alta sensibilidade interações entre proteínas. No trabalho, o dispositivo utiliza como prova de conceito a detecção da interação entre ADAM17, uma metaloproteinase associada ao desenvolvimento e à progressão de diferentes tipos de tumores, com seu ligante, tiorredoxina.

O biossensor eletroquímico pode abrir caminho para futuros testes rápidos capazes de contribuir com diagnósticos e até prognósticos de câncer e outras doenças. A ideia é detectar proteínas associadas às patologias em amostras de saliva e outros fluidos corporais (conhecida como biopsias líquidas) e, assim, contribuir com os clínicos na decisão de terapias mais adequadas para cada paciente.

 

Um outro aspecto importante do desenvolvimento do modelo prototipado é que estão sendo considerados insumos disponíveis e viáveis no Brasil e processos industriais que viabilizem a fabricação em larga escala, com o menor custo possível.

O trabalho contou com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e foi conduzido pelos pós-doutorandos Luciana Trino e Luiz Gustavo Albano. Embora o biossensor ainda esteja em fase inicial de desenvolvimento já foi feito um depósito de patente.

“É um biossensor que pode ser muito promissor para aplicação na prática clínica. Está em fase inicial de desenvolvimento, mas podemos dizer que a parte mais difícil foi até aqui, validar um protótipo. Agora a gente trabalha para melhorar o que foi feito”, esclarece a pesquisadora Adriana Paes Leme.

Dispositivo multifuncional

O pesquisador Carlos Bufon, especialista em nanodispositivos e nanomateriais, explica que o componente foi idealizado como uma plataforma que tem como base uma estrutura metalorgânica (ZIF-8) sintetizada para se obter a porosidade e formas adequadas, de modo que as biomoléculas de interesse se “encaixem” e permitam o reconhecimento da atividade elétrica em meio líquido. Uma plataforma capaz de traduzir sinais bioquímicos de forma altamente eficiente.

“Usando a analogia da chave e do cadeado. O elemento biomarcador que buscamos precisa encontrar o seu respectivo cadeado. O dispositivo é capaz de detectar o momento em que esse encontro acontece, a duração do contato, e outros detalhes da reação bioquímica. Essa relação é muito específica, o que reduz muito a problemática dos falsos positivos ou falsos negativos”, avalia Bufon.

A prova de conceito bem-sucedida do dispositivo monitorou interações entre proteínas, o que para a coordenadora da pesquisa, Adriana Paes Leme, foi um “desafio” assumido justamente para avaliar os níveis de sensibilidade de detecção do sensor.

“Nós desafiamos o biossensor para detectar a interação entre duas proteínas conhecidas por terem uma interação relativa de baixa afinidade. Na próxima etapa, nós vamos monitorar anticorpos contra seus alvos, cujas interações são específicas e muito mais fortes, portanto, capazes de detectar de forma ainda mais eficiente marcadores de doenças”, prevê Adriana Paes Leme.

 

Da pesquisa básica à inovação

A ADAM17, proteína utilizada no desenvolvimento do protótipo, é estudada há tempos por pesquisadores do CNPEM. Essa proteína apresenta papel na progressão de câncer de boca e os pesquisadores observaram que seus mecanismos de sinalização dependem da interação direta entre a ADAM17 e a tiorredoxina. Esse resultado bem sucedido de pesquisas anteriores permitiu usar esse conhecimento para estudar essa interação como prova de conceito do protótipo.

A expectativa é testar em uma próxima etapa a capacidade de detectar potenciais biomarcadores de câncer de boca. Após acompanhar pacientes com câncer oral por cinco anos e realizar análises na saliva e nos tecidos tumorais dessas pessoas, os pesquisadores do Centro descobriram e validaram proteínas que funcionam como “uma assinatura molecular” associadas à gravidade do câncer oral, o tipo mais comum de tumor maligno de cabeça e pescoço.

“Já identificamos e publicamos artigos sobre diferentes proteínas que se mostram capazes de antecipar ou prever a progressão da doença e indicar se há a presença de metástase. Desde o início, nosso objetivo tem sido buscar meios de aplicar o conhecimento à prática clínica como a utilização de biossensores inovadores, voltados a apoiar os profissionais de saúde no diagnóstico precoce da doença e nas tomadas de decisões sobre os tratamentos mais apropriados”, esclarece Adriana Paes Leme.

A tecnologia empregada no desenvolvimento do sensor permite alcançar esses objetivos identificando a interação de diferentes proteínas e/ou anticorpos, relacionados às mais diversas doenças. O pesquisador Carlos Bufon retoma a analogia das chaves e cadeados para dar uma visão futura da potencial versatilidade da plataforma de diagnóstico:

“A hora que você colocar na mesma plataforma vários tipos de proteínas/anticorpos para ter vários cadeados que reconheçam várias chaves no mesmo dispositivo, o sinal elétrico vai ser proporcional à essa inúmera quantidade de chaves e cadeados. Aí os recursos da Inteligência Artificial podem ser muito úteis para identificar os padrões que buscamos”.





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