Lei Anticorrupção leva empresas a investir em programa de compliance
Por Bárbara Pombo, Fernando Torres e Laura Ignacio | De Brasília e São Paulo
21/08/2013

Aprovada a toque de caixa pelo Congresso Nacional, em resposta às manifestações populares, a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846) já gerou uma reação de empresas preocupadas com as pesadas condenações. Muitas pretendem investir em programa de compliance. Quem já o adotou, quer revisá-lo para ter certeza de que poderá servir como atenuante da pena.

A primeira percepção das empresas é de que, a partir de agora, deverão ter um papel ativo no combate a práticas ilícitas. Isso porque, segundo advogados, a existência de áreas de compliance será um atenuante na hora de aplicar punições. Além disso, o texto legal, a exemplo do que faz a Lei de Defesa da Concorrência, traz uma espécie de "delação premiada" para a empresa que denunciar atos ilegais - como é notório no caso da Siemens, sobre a suposta existência de cartel em licitações do Metrô de São Paulo e de outros Estados. Na hipótese de delação, a pena pode ser reduzida em dois terços.

Outro preocupação é com a abrangência da lei, que prevê punição mesmo sem comprovação de culpa ou dolo e pode ser aplicada por inúmeros órgãos de municípios, Estados e governo federal.

"O positivo é que, além de incentivar investimentos para o compliance das subsidiárias no Brasil, a nova lei deve atrair investimentos estrangeiros ao país", diz a advogada Renata Muzzi Gomes de Almeida, da área de Compliance de TozziniFreire. Segundo ela, empresas de setores como o farmacêutico e de cosméticos, cujo cliente é majoritariamente o governo, já procuram os escritórios para fazer "auditorias de compliance". "Mesmo sem a regulamentação da nova lei, essas empresas acreditam que serão as primeiras a serem avaliadas", afirma Benny Spiewack, do escritório ZCBS Advogados.

Assim, casos recentes como o da farmacêutica Eli Lilly, nos Estados Unidos, que envolveu distribuidoras brasileiras para ganhar licitações no país, e que acabaram com multa de cerca de US$ 30 milhões aplicada à controladora nos EUA, com base na norma anticorrupção americana, o "Foreign Corrupt Practices Act" (FCPA), passarão a resultar em multa também para as companhias brasileiras.

A FCPA é aplicada a empresas americanas ou localizadas nos EUA, com capital aberto naquele país ou que tenham registro na Securities and Exchange Commission (a CVM dos Estados Unidos), mesmo sem filial no país. "Se esses casos acontecessem a partir de fevereiro, poderiam ser investigados também no Brasil, com base na lei brasileira", diz o advogado Giovanni Falcetta, do Aidar SBZ Advogados. Uma das maiores multas já aplicadas com base no FCPA é a referente a um caso da Siemens, de 2007, de US$ 800 milhões.

De acordo com especialistas, a lei brasileira afeta não apenas as empresas que participam de licitações, mas todas que tenham qualquer relação com o setor público. Dar uma carona a um servidor ou político será motivo de sanção? E uma doação institucional de computadores para escolas? "A lei é abrangente e inclui itens que, strictu sensu, não seriam tratados como corrupção", afirma Mariana Araujo, sócia do Levy & Salomão Advogados.

A Lei nº 12.846 é a primeira a responsabilizar empresas brasileiras na esfera administrativa por lesar o patrimônio público, mesmo que atuem no exterior. As leis de licitações e de defesa da concorrência, a lei contra a improbidade administrativa e a contra crimes tributários e o próprio Código Penal também impõem penas, mas especialistas dizem que, muitas vezes, elas não alcançam as empresas em razão de o andamento no Judiciário ser muito lento e da dificuldade da comprovação de culpa ou dolo.

Segundo Pierpaolo Cruz Bottini, sócio do escritório Pierpaolo Cruz Bottini, Bottini & Tamasauskas Advogados, essa profusão de leis tratando de corrupção terá consequências. "Um mesmo caso pode gerar processos com base na lei anticorrupção, por improbidade, pela lei de licitação, uma ação civil pública, um processo no Cade e uma ação penal", enumera.

Há empresas preocupadas com diferenças ante as leis internacionais. Pela FCPA, se uma empresa denunciar casos de corrupção de seus fornecedores que atuam em seu nome, a delatora não receberá qualquer punição - e isso não está previsto na lei local.

Já as instituições financeiras têm receio de sofrer sanções por dar crédito a uma empresa vencedora de licitação, que se descobre, no futuro, ser uma fraudadora. Empresas em processos de fusões e aquisições também terão de ficar atentas. "Os processos de due diligence vão ter que incluir itens anticorrupção", diz Renato Portella, sócio do Mattos Filho.

A lei também dá margem para diferentes cálculos da multa. O texto diz, por exemplo, que controladas, controladoras e até mesmo coligadas poderão ser chamadas para pagar a conta de forma solidária. Mas dá a entender que ela será calculada com base no faturamento da companhia, e não do grupo econômico.

Outras três questões prometem ser "o calo no sapato" das empresas agora vulneráveis a punições milionárias: a liberação de financiamento privado de campanhas, a estabilidade dos servidores públicos e a falta de regulamentação do lobby no Brasil. "Nunca foi tão necessário estabelecer limites à atividade ainda considerada ilícita", diz a advogada Ariane Guimarães, integrante da Comissão de Direito Internacional da Ordem dos Advogados do Brasil.

Apesar de a lei prever punição independentemente de culpa ou dolo da empresa, advogados preveem que o Judiciário poderá rever as decisões da Controladoria-Geral da União (CGU) com base em princípios constitucionais de proporcionalidade e na presunção de inocência. "A CGU deverá estar munida de muita prova para responsabilizar a empresa. Caso contrário, o Judiciário poderá rever a decisão", diz Ariane, citando os casos de decisões administrativas que demitem servidores públicos e são anuladas pela Justiça por aspectos formais ou falta de observância da Lei do Servidor Público.







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