Financiar SUS é dilema, dizem especialistas
21/10/2020

O maior desafio do pós-pandemia no âmbito da saúde será fechar a equação do financiamento do SUS, frente às pressões adicionais sobre o sistema a partir de 2021 e às regras de restrição fiscal impostas pela Emenda Constitucional 95, avaliaram especialistas no webinar ‘Valor Fórum Acesso à Saúde’, sobre desafios e perspectivas para o setor. A importância de reduzir a desigualdade no acesso a tratamentos, assim como construir modelo sustentável de incorporação tecnológica, também foi um ponto levantado. 

Para os técnicos, o debate permeia a melhor interação entre os setores público e privado, o incremento do complexo industrial e a implementação de reformas para a melhor canalização de recursos. “Os grandes desafios para 2021 dizem respeito ao financiamento, porque tivemos em torno de R$ 134 bilhões de orçamento este ano para o Ministério da Saúde e recebemos um incremento de R$ 41 bilhões para a conta covid”, pontuou Denizar Vianna, professor associado da Faculdade de Ciências Médicas da Uerj, ao lembrar que não há previsão para esse reforço no ano que vem. 


O que se discute no Congresso, conforme o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA), é que os recursos voltam a ser limitados ao teto de gastos, na concepção de Vianna ponto crítico em face do histórico subfinanciamento do SUS. “Está na hora de a sociedade discutir isso”, disse o técnico, ao mencionar a necessidade de avançar no debate sobre renúncia fiscal e tributação regressiva. 

 

Outro aspecto que deve ser revisto, segundo ele, é a dependência internacional do país no abastecimento de insumos de saúde, fornecidos em larga escala por países como China. Uma das fragilidades no enfrentamento à covid-19 foi a dificuldade de comprar respiradores para equipar UTIs. “Temos que desenvolver capacidade local para produzir insumos estratégicos”, frisou Vianna, ex-secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, nas gestões de Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. 

Presidente do Instituto Oncoguia, a médica Luciana Holtz afirmou que, apesar dos avanços no campo do tratamento do câncer, o acesso a medicamentos não se dá de forma igualitária. 

“Vemos cada vez mais uma situação de ampliação da desigualdade”, disse ela, referindo-se às diferenças entre os pacientes da saúde suplementar, os que dependem do SUS, e mesmo dentro do SUS, em parte devido à judicialização do sistema. 

Na visão do secretário da Saúde do Maranhão e presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass), Carlos Lula, o baixo gasto federal com saúde - com repasses de recursos em queda, nos últimos anos, para Estados e municípios - é um dos fatores que impactam o acesso aos serviços. “Como vamos dar acesso às pessoas que precisam de medicamentos cada vez mais caros, se temos cada vez menos recursos para bancar?”, questionou. 

Para Ana Maria Malik, coordenadora do FGV Saúde, ao debater a assistência à população, não é possível dissociar serviço público e privado de saúde, segundo ela sistemas complementares. A médica observou ainda que é importante adaptar oferta de serviço, não em razão do que há de disponível no país, mas ao que de fato é necessário segundo às diferenças regionais. “Ainda temos um sistema de saúde voltado para questões agudas, quando hoje há muitas condições crônicas”, acrescentou. 

Economista do Ipea e vice-presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres), Carlos Ocké-Reis afirmou que boa parte dos problemas de gestão do SUS decorre da hipossuficiência de financiamento. Para ilustrar, Ocké-Reis citou dados de 2015 comparando gastos públicos com sistemas dos EUA, da Alemanha e do Reino Unido. Na Alemanha, em relação ao PIB, o gasto público com saúde gira em 9,4%, nos EUA, 8,5%, e, no Reino Unido, 7,9%, enumerou. “E no caso brasileiro, com 211 milhões de habitantes, nós gastamos 3,8% do PIB e em torno de US$ 595 [per capita/ano].” 

 Ocké-Reis lembrou que o gasto público federal per capita em saúde vêm caindo de 2013. “Você tem um modelo de financiamento que favorece o sucateamento do SUS. E por isso, em plena pandemia, foi necessário, inclusive, créditos extraordinários, que foram permitidos pelo Decreto de Calamidade Pública e pela Emenda Constitucional 106.” 

Fonte: Valor




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