Falta de planejamento é risco para logística de vacinação contra covid
23/11/2020

Com os avanços da corrida por uma vacina contra a covid-19 no Brasil, especialistas em saúde agora se preocupam com a infraestrutura necessária para uma campanha de imunização de porte nunca visto no país. Isso passa pelo provimento de materiais de fácil fabricação, como seringas e agulhas, e aspectos mais complexos, como armazenamento de produtos que exigem resfriamento agudo. 

O professor de ciências farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) Marco Antônio Stephano afirma que os governos federal e subnacionais ainda estão muito centrados no debate sobre o desenvolvimento da vacina e não têm se preparado para recebê-la com materiais simples, o que pode ser um gargalo na hora de vacinar a população. “O Brasil já realiza campanhas de vacinação grandes, com cerca de 300 milhões de doses todos os anos, e que não vão parar. Terão de acontecer em paralelo à do coronavírus. Se não houver planejamento, pode faltar o básico: seringa e agulha”, diz Stephano. 

 
 
A necessidade inédita de vacinar toda a população e a provável exigência de duas doses por pessoa para se atingir a imunização, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), vão pressionar a logística de vacinação contra a covid-19, alertam os especialistas ouvidos pelo Valor. 

 

 

Fontes familiarizadas com a preparação do Plano Nacional de Imunização (PNI), pelo Ministério da Saúde, dizem que o governo federal planeja oferecer 300 milhões de doses gratuitas até o fim de 2021, a maior parte com a vacina criada pela Universidade de Oxford junto à farmacêutica AstraZeneca, além de outras opções em desenvolvimento na coalizão Covax Facility, liderada pela OMS. A esses lotes, se somariam as vacinas estaduais, como a de São Paulo, onde o Instituto Butantan pretende envasar 40 milhões de doses da chinesa Coronavac ainda neste ano e adentrar 2021 entregando mais unidades, envasadas ou fabricadas no Estado. 

Com o dobro de doses no PNI e outras iniciativas concorrentes, haveria sobrecarga no mercado de produtos médico-hospitalares, diz Stephano. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde (Abimed), Fernando Silveira, informa que os fabricantes ainda não receberam nenhuma encomenda ou sinalização por parte de governos ou do SUS, o que pode trazer dificuldades em caso de aumento repentino na demanda. 

O mercado brasileiro de seringas e agulhas, diz Silveira, é dominado pelas fabricantes Becton Dickinson (BD), Saldanha Rodrigues (SR) e Injex. As três, diz ele, têm capacidade instalada para produzir 1,5 bilhão de kits ao ano, sendo 1,2 bilhão de unidades a demanda padrão, sem pandemia. “O setor opera com 80% da capacidade, sem muita margem para cobrir mais pedidos de uma hora para outra. Passa da hora de os entes federativos prepararem o setor, com sinalização formal sobre qual será a demanda e o prazo para a entrega dos produtos”, diz Silveira. 

“Com duas doses por pessoa, para imunizar 90% da população, são quase 400 milhões de vacinas a mais”, calcula. Segundo o executivo, países como Estados Unidos e Canadá já aumentaram a compra de seringas. “Todos sabem que estamos em um ponto de virada, com vacinas na fase três de testes. Nenhum país quer dormir no ponto com coisa tão básica”, diz. 

 O Ministério da Saúde não respondeu aos questionamentos da reportagem. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que integra o consórcio da vacina de Oxford, informou que o provimento de material necessário à vacinação é responsabilidade do governo federal em articulação com Estados e municípios e que entregará a vacina em frascos com cinco doses cada um a serem armazenados em temperaturas de 2ºC a 8ºC, adequada à rede de frio existente no país. A Fiocruz planeja entregar 100,4 milhões de doses no primeiro semestre de 2021 e outras 110 milhões de unidades no resto do ano. 

Fonte: Valor




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