Startup que ajuda a importar remédios de maconha capta R$ 2 mi em nova rodada
21/12/2020

Em dois meses, a Argentina e o México ampliaram suas legislações para a maconha medicinal, e a Organização das Nações Unidas (ONU) retirou a planta da lista de drogas mais perigosas, apontando para suas propriedades medicinais. Enquanto isso, em todo o mundo, milhões de pacientes com epilepsia, dor crônica, ansiedade e autismo já têm buscado medicamentos com cannabis para tratar seus quadros.

É neste cenário efervescente e de repensar o papel que a visão sobre a planta teve até aqui que a Dr. Cannabis, startup fundada em 2017 pela empresária Viviane Sedola, tem atuado nos últimos três anos.

Auxiliando pacientes no processo de importar medicamentos de cannabis pelas vias legais, a startup concluiu a captação de uma rodada de investimento de 2 milhões de reais, em um aporte via equity crowdfunding, a “vaquinha” para financiamento de startups.

A rodada, a segunda da Dr. Cannabis, teve a meta atingida após 20 dias de campanha pela plataforma StartupMeUp, com cerca de 250 investidores.

A Dr. Cannabis tem hoje 30.000 pacientes ou responsáveis cadastrados. São desde portadores de doenças que poderiam se beneficiar dos novos remédios a pais com filhos de doenças raras ou parentes de idosos com Alzheimer, explica Viviane.

 

No Brasil, a Anvisa autoriza de forma específica desde 2015 que alguns pacientes com doenças crônicas importem medicamentos à base de canabidiol (CBD). A Dr. Cannabis não atua efetivamente importando medicamentos, apenas ajudando as famílias no processo e no contato com médicos que atuam na área. A importação, pelas regras da Anvisa, precisa ser feita pelos próprios pacientes.

Mais de 16.000 autorizações já foram concedidas pela Anvisa, e Viviane afirma que a concorrência — com novas marcas de remédios e mais acesso ao mercado brasileiro por empresas estrangeiras — têm diminuído os preços. Ainda assim, a importação segue sendo um processo caro, demorado e pouco acessível às famílias mais pobres. Para muitos remédios, o preço pode passar de 2.000 reais.

O mercado de cannabis medicinal é financeiramente promissor em todo o mundo — apesar dos preconceitos que o envolvem. Levantamento da NewFrontier com o grupo The Green Hub, uma aceleradora de startups desse ramo, estimou que a receita potencial da cannabis medicinal no Brasil poderia chegar a 442 milhões de dólares, e passar de 1,4 bilhão se inclusos os tratamento de dores crônicas.

Na Dr. Cannabis, para além da frente de educação, grande parte do trabalho é a conexão entre pacientes e médicos que atuam nas pesquisas com cannabis medicinal. Encontrar um médico que entenda do tema não é trivial, diz Viviane, o que se torna outro obstáculo às famílias.
 

São 3.000 médicos parceiros para ajudar na disseminação de informações — desses, cerca de 120 são profissionais efetivamente prescritores, que atendem a pacientes, muitos via telemedicina, e ajudam nas orientações sobre usar ou não medicamentos com cannabis para cada caso.

No último mês de agosto, a Dr. Cannabis também organizou virtualmente o “I Congresso Digital de Cannabis” com público de mais de 15.000 pessoas. “Afinal, você sabe por que não aprendeu sobre o sistema endocanabinoide na faculdade de medicina?”, provoca a descrição do evento.

É de olho no potencial de crescimento do mercado que a startup projeta chegar a um faturamento entre 32 milhões de reais a 128 milhões de reais nos próximos anos. Com o novo aporte, a Dr. Cannabis planeja ampliar sobretudo os investimentos em tecnologia, com novas ferramentas como conteúdo pago à comunidade, plataforma de apoio à prescrição médica com inteligência artificial e publicidade de nicho para empresas.

A discussão sobre maconha medicinal no Brasil

No Instagram — pelo cannabizwoman —, Viviane também comenta as informações e desdobramentos da regulação da maconha no Brasil e no mundo. A empresária participa ativamente das discussões do PL 399/2015, que analisa a permissão de plantio de maconha para fins medicinais no Brasil.

Os pacientes e médicos parceiros da Dr. Cannabis acompanham o tema com atenção: a expectativa é que a permissão de plantio nacional reduza os custos e amplie o acesso às famílias que precisam.

Uma outra regulação da Anvisa, de dezembro do ano passado, até começou a discussão ao permitir que farmácias vendessem produtos com cannabis sob prescrição médica. O primeiro medicamento produto de cannabis foi registrado em abril deste ano. Já produtos com taxa acima de 0,2% de THC (a principal substância psicoativa da maconha) só podem ser usados se esgotados outros tratamentos. Nesse caso, o médico responsável pelo tratamento tem que atestar que outros remédios falharam com o paciente.

Na mesma votação, a Anvisa rejeitou a autorização para plantio medicinal, que decidiu deixar a cargo do Congresso. Duas organizações brasileiras que representam pacientes de cannabis ganharam ações nos últimos anos com autorização para plantar.

O projeto de lei ainda não foi votado na Câmara. Apesar da resistência de alguns setores da sociedade, o PL é visto como mais restritivo do que, por exemplo, as novas regras argentinas aprovadas neste ano.

 

O texto brasileiro, da forma como está, exigiria que as organizações ou empresas que fizerem o plantio regulem de forma específica as quantidades de substância nas plantas, com doses rigorosas de THC. As exigências são criticadas por parte das associações de familiares de pacientes, por tornarem o plantio caro e inviável.

Viviane aponta que há questionamentos sobre o PL, mas acredita que, por ora, qualquer regulação já ajudaria a avançar a pauta, estagnada no Brasil enquanto outros países sul-americanos se movimentam sobre o tema. No Hemisfério Norte, em países como EUA, Canadá e países europeus, as regras são ainda mais permissivas, algumas incluindo permissão até mesmo para uso da maconha para fins recreativos (uso social).

Havia uma expectativa entre os envolvidos no Congresso de que o projeto pudesse avançar ainda sob a presidência de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na Câmara. Mas com a agenda apertada pós-eleições e o mês de janeiro sendo destinado à discussão do orçamento e preparação para a eleição da mesa diretora em fevereiro, há uma chance grande de que o tema fique para os próximos presidentes da Câmara e Senado.

Em entrevista à Exame em novembro, o deputado Luciano Ducci (PSB-PR), relator do projeto, se disse confiante em um avanço rápido. “Temos parlamentares que apoiam e defendem o projeto em todos os partidos e espectros ideológicos. Acredito que, tiradas as polêmicas e as informações falsas, a causa em si, a medicinal, em específico, tem grande apelo e apoio”.

Fonte: Exame




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