Vacinação atrasa e ameaça a retomada econômica global
01/02/2021

 
Os cronogramas para a vacinação de um número de pessoas suficiente para efetivamente conter a covid-19, não estão sendo cumpridos em muitos países, despertando temores de que uma grande parcela do mundo ainda estará lutando contra a pandemia em seus efeitos econômicos durante uma boa parte de 2022 e além. 

Os Estados Unidos e alguns outros países, em sua maioria pequenos, estão progredindo para vacinar a maior parte de suas populações até o fim do terceiro trimestre, mas especialistas em saúde e economistas estão chegando à conclusão de que grande parte do planeta - incluindo partes da Europa, Ásia e América Latina - enfrentarão um caminho mais árduo. 

 

Países que vão da Alemanha ao México estão com sérios problemas para a obtenção de vacinas suficientes. Outros, com menos casos, estão sendo menos pressionados a iniciar campanhas de vacinação e não estão dispostos a abrir suas fronteiras no curto prazo. 

Às taxas atuais de vacinação, apenas cerca de 10% do mundo será imunizado até o fim do ano, e 21% até o fim de 2022, segundo o banco UBS. Apenas dez países caminham para vacinar mais de um terço de sua população neste ano. 

Os dados do UBS incluem países de renda média duramente atingidos, como a África do Sul, onde as taxas de vacinação deverão ser dolorosamente baixas, embora o banco diga que alguns países monitorados por ele deverão aumentar o ritmo da vacinação em breve. 

Mas regiões mais ricas, como a Europa, também estão enfrentando atrasos. A meta europeia de vacinar 70% da população até o terceiro trimestre parece inatingível depois que alguns países ficarem sem doses e com apenas 2% da população da União Europeia (UE) vacinados até agora. 

O ritmo diferente da vacinação no mundo levanta a possibilidade de perspectivas econômicas divergentes para os principais blocos econômicos, pelo menos no curto prazo. A economia dos EUA poderá crescer 5,1% este ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), mas a recuperação da zona do euro e das economias em desenvolvimento ficaram mais incertezas com os atrasos na vacinação. 

Os EUA e uns poucos outros países poderão acabar gozando de muitos benefícios da imunidade de grupo, mas ainda assim se verem incapazes de reparar suas economias por dependerem de mercados onde a vacinação atrasou. Com as fronteiras globais fechadas, algumas empresas terão de depender da demanda interna, mesmo em países em que a vacinação está avançando sem percalços. 

“Enquanto a pandemia continuar aterrorizando o mundo, a normalidade não será restabelecida em nenhum lugar”, afirmou Erik Nielsen, economista-chefe do banco UniCredit. 

A distribuição desigual das vacinas também significa que a covid-19 poderá continuar circulando durante anos, especialmente em países como o Brasil ou a África do Sul, onde novas cepas virulentas estão superando as imunizações. 

Muitos cientistas e autoridades previram que os programas de imunização levariam muito tempo. Mesmo assim, o desenvolvimento extraordinariamente rápido de vacinas aumentou as esperanças de que 2021 representaria um retorno á normalidade na maior parte do mundo. Economistas, porém, começaram a rever essas previsões. 

Ainda há uma expectativa de que o crescimento global será vigoroso neste ano e as populações de muitos países, como os EUA, sem dúvida verão restaurantes abertos e outros sinais de progresso. A recuperação já é tão forte em alguns lugares que está havendo problemas no fornecimento de semicondutores. 

Os EUA e o Reino Unido experimentaram inicialmente atrasos nas campanhas de vacinação, mas a distribuição foi acelerada à medida que as dificuldades foram sendo superadas. 

Mesmo assim, as perspectivas estão cada vez mais incertas em outras partes do mundo. Fronteiras estão fechadas em grande parte da Europa. A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, disse na semana passada que o país continuará impedindo a entrada de visitantes estrangeiros durante a maior parte de 2021. Uma autoridade de alto escalão da Austrália fez recentemente uma previsão parecida, em parte porque ainda não está claro se as vacinas contra a covid-19 evitam a transmissão do vírus ou apenas impedem que as pessoas fiquem gravemente doentes. 

 

 
 

Até mesmo Israel, país em que a vacinação está avançando de forma mais rápida, permanece em “lockdown”, com os voos internacionais ainda proibidos de pousar em seu território por tempo indeterminado. 

“Essa suposição, de que quando o 1º de janeiro viesse poderíamos queimar o calendário velho e tudo estaria bem, está se mostrando uma visão otimista demais”, disse Robert Carnell, economista do ING Group em Cingapura. 

O Banco Mundial prevê que as remessas de dinheiro para os países em desenvolvimento - uma fonte crucial de receitas - cairão 7,5% neste ano, depois de uma retração de 7% em 2020. As salas de concertos, cinemas e escolas poderão permanecer fechadas por mais tempo que o esperado. 

Hotéis em lugares como o Sudeste Asiático e o Pacífico não esperam uma recuperação total dos negócios antes da metade do ano que vem. Empresas de transporte, como a DHL, acreditam que o transporte aéreo de cargas continuará mais apertado na primeira parte deste ano, e não melhor, uma vez que há um número menor de aviões transportando cargas. As discussões na Organização das Nações Unidas (ONU) para a normalização do tráfego aéreo, seja com a criação de um passaporte de vacina ou mesmo um conjunto comum de normas para testes, estão presas na burocracia da ONU. 

O tráfego aéreo intercontinental não retornará aos níveis de 2019 antes de 2023, segundo prevê a Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata). “Estamos falando em anos, não em meses, e isso está em parte relacionado às velocidades diferentes na vacinação”, disse Nick Careen, vice-presidente sênior da Iata. “Precisamos que os governos cheguem a um processo. Não podemos continuar operando assim.” 

Um problema crucial é que está se mostrando difícil aumentar rapidamente a produção de vacinas. Atrasos nas entregas podem ter um efeito dominó sobre outros compradores. 

Na Europa, onde várias vacinas importantes são feitas, problemas de produção surgiram no mês passado, com fábricas alegando que não estão dando conta da produção. Frustrada, a UE implementou novas medidas na sexta-feira, que lhe permitirão impedir as exportações para os países mais ricos, como Canadá, Japão e EUA. 

 

A produção lenta numa fábrica belga levou as autoridades canadenses a receberem recentemente 70% menos doses da vacina da Pfizer. Os mesmos problemas deixaram o Japão com dificuldades para conseguir as doses de que necessita para vacinar sua população até o fim de junho, o que poderá significar menos público para a Olimpíada de Tóquio em julho. 

“Não tenho como dizer qual mês”, respondeu Taro Kono, o ministro encarregado do programa de vacinação japonês, quando perguntado quando a população em geral estará vacinada. 

A China também está com dificuldades. Embora tenha iniciado a vacinação usando vacinas produzidas localmente, sem fornecer um cronograma firme para o alcance da imunidade de grupo, as aprovações e os acordos de produção estão mais lentos do que o antecipado, segundo a consultoria Trivium China. 

“O principal problema é o volume de produção”, disse em entrevista Guo Wei, vice-secretário-geral da associação de logística de cuidados com a saúde da China Federation of Logistics and Purchasing, entidade apoiada pelo governo. Ele afirmou que, baseado nas estimativas de produção dos fabricantes chineses de vacinas, o país não conseguirá alcançar a imunidade de grupo ainda neste ano. 

A Trivium estima que um total de 850 milhões de doses é o máximo que a China conseguirá produzir neste ano, enquanto que, para a vacinação completa, seria preciso fornecer pelo menos 1,68 bilhão de doses. A Economist Intelligence Unit não descarta a possibilidade de algumas grandes cidades chinesas alcançarem a imunidade de grupo neste ano, mas estima que o país como um todo provavelmente não conseguirá isso antes do fim de 2022. Qualquer atraso na produção na China poderá afetar outros países. 

Analistas duvidam que outros países conseguirão alcançar suas metas declaradas. Na Indonésia, as autoridades querem vacinar 65% da população, de 270 milhões de pessoas, em 15 meses, mas é mais provável que isso leve de três a quatro anos, segundo analistas da IMA Asia. As Filipinas querem vacinar 70 milhões de pessoas neste ano. “Achamos que nem mesmo metade da meta para 2021 será alcançada”, disse a IMA Asia em um relatório recente. 

Os dois maiores países da América Latina, Brasil e México, imunizaram até agora apenas 0,9% e 0,5% de suas populações, respectivamente. A Argentina esperava receber 5 milhões de doses da vacina russa Sputnik V em janeiro, mas somente 800 mil foram entregues em razão de atrasos na produção na Rússia. 

Fonte: Valor




Obrigado por comentar!
Erro!
Contato
+55 11 5561-6553
Av. Rouxinol, 84, cj. 92
Indianópolis - São Paulo/SP