Na Rede Santa Catarina, com 11 unidades de saúde em quatro estados, como o Hospital Santa Catarina, na Avenida Paulista (SP), e a Casa de Saúde São José, no bairro do Humaitá (RJ), o número de contratações de líderes (gerentes para cima) passou de duas, em 2020, para dez este ano, até setembro, sendo seis gerentes e quatro diretores. Foram 14 promoções no ano passado, ante três este ano. A rede tem 10,2 mil funcionários e 1.797 leitos - 205 foram adicionados na pandemia.
Na capital paulista, na esteira dos desdobramentos da crise sanitária, a instituição criou cinco novas áreas, como um centro médico para reabilitação pós-covid, três UTIs e uma unidade respiratória integrada (URI).
Dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do governo federal, indicam que, no primeiro semestre de 2021, foram registrados 64,8 mil afastamentos por mais de 15 dias relacionados à covid-19, ante 37 mil casos, de abril a dezembro de 2020, um salto de 75%. “Mantemos um programa de recrutamento interno, a fim de aproveitar os nossos talentos”, explica André Garcia, superintendente da Rede Santa Catarina. Se os requisitos para a nova vaga não são preenchidos “em casa”, abrimos a vaga no mercado, afirma. Para cargos estratégicos ou de alta complexidade, que chegam a corresponder a 11% das contratações, a empresa usa os serviços de recrutadores.
Dependendo da área e do cargo, o garimpo de um gestor pode durar 90 dias. “Não é comum encontrarmos mão de obra disponível para início imediato”, afirma. Do total contratado em 2021, 22% vieram de estados diferentes das sedes da rede.
No Hospital Albert Einstein, um dos mais procurados por profissionais da área, eram 11 vagas em aberto para cargos de liderança em outubro. Das 60 posições fechadas em 2021, nos níveis de gerência e coordenação, 65% vieram de recrutamento externo, via site institucional, busca ativa no LinkedIn e no Vagas.com - o restante foi suprido com peneiras internas. O hospital tem 18,1 mil funcionários e operação em quatro estados (SP, GO, RJ e PE).
Entre 2020 e 2021, a quantidade de contratações e promoções no Einstein subiu ou se manteve em pelo menos três áreas principais. Na assistencial, passou de 61 para 60, na “corporate” subiu de 33 para 37 e em ensino e pesquisa foi de três para 19. De acordo com Miriam do Carmo Branco da Cunha, diretora de RH da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, que controla a instituição, um dos departamentos mais impactados com volume de trabalho na pandemia foi o de telemedicina. “A base de pessoas com acesso aos serviços subiu de 200 mil, no pré-pandemia, para dois milhões”, diz.
O Hospital Alemão Oswaldo Cruz, com 3,7 mil funcionários em São Paulo (SP), tinha 84 oportunidades em aberto em outubro, sendo 2,4% para cadeiras de gestão, segundo Antônio Bastos, diretor executivo médico da instituição. Em agosto, o hospital inaugurou um centro especializado em tratamento pós-covid, com dois consultórios de infectologia, que funcionam como “porta de entrada” para os pacientes, além de uma equipe multidisciplinar, composta por especialistas como pneumologistas e cardiologistas. A organização estuda ainda lançar uma “telerreabilitação”, para que o serviço chegue a pessoas que não conseguem ir à unidade. Boa parte das contratações do Oswaldo Cruz, segundo Bastos, é realizada com o apoio de parceiros, como a startup Gupy, de softwares de recrutamento, seleção e admissão on-line. “Além disso, utilizamos o nosso site e redes sociais”, diz.
Na avaliação de Fernando Torelly, superintendente corporativo e CEO do Hcor, com um quadro de 4,8 mil profissionais, identificar um bom líder ainda é um grande desafio para as organizações, especialmente entre hospitais com alta exigência sobre as competências técnicas dos gestores. As características comportamentais também estão subindo a régua, diz. Pessoas “inspiradoras”, com fácil comunicação, positivas e agregadoras permanecem no radar do complexo hospitalar que, com a pandemia, implementou um pronto-socorro com foco no atendimento de síndrome gripal e um programa de reabilitação pós-covid, de suporte a pacientes com queixas de dor muscular, fadiga e sensação de desconforto ao respirar.
No ano passado, o Hcor contratou três líderes e promoveu quatro profissionais a cargos gerenciais. Em 2021, já foram quatro contratações e três promoções internas. Havia cinco posições gerenciais disponíveis em outubro.
A procura mais ativa de líderes para grupos de saúde pode estar apenas começando, segundo Guerra, da Michael Page. “Teremos uma demanda crescente de gestores pelos próximos três anos.” Para “dourar” as ofertas de trabalho e captar os melhores currículos, algumas instituições estão oferecendo “hiring” bônus (bônus de entrada, oferecido na contratação), chegando a pagar de dois a quatro salários fixos na assinatura do contrato, afirma.
Em 2020, a Michael Page atuou em dez vagas ligadas à gestão de saúde, principalmente em hospitais e operadoras. Este ano, até setembro, foram mais de 25 seleções. De acordo com Guerra, as chefias dos centros médicos buscam gestores dotados com a “trinca” de “As”: ambiguidade (saber lidar com), adaptabilidade e atitude. “São competências que sintetizam bem o profissional buscado”, explica. “Ele vai se deparar constantemente com situações ambíguas no ambiente de trabalho, precisará se adaptar a um cenário em constante mudança e terá de mostrar atitude para executar o que for necessário.” O principal desafio do recrutamento nesse mercado, destaca, é identificar currículos que unam visão do negócio ao cuidado no atendimento à saúde.
O consultor diz que, para costurar a retenção do profissional e afastar os “olhos” da concorrência, outra oferta na mesa das instituições são planos de carreira com objetivos agressivos, aliados a uma política de compensação “elevada”, de acordo com o desempenho. “O bônus desses executivos tem transitado entre dois e seis salários anuais e é comum ver novos benefícios, como auxílio moradia, passagens aéreas, carro e stock options [opção de compra de ações].”
Contratado no ano passado pelo HCor, o superintendente médico Gabriel Dalla Costa, 39 anos, lidera diretamente 30 profissionais, entre gerentes e coordenadores. “Também sou responsável pela gestão do corpo clínico, com 1,1 mil especialistas”, diz.
Dalla Costa se movimenta na área médica desde o término da graduação, em 2006, e combinou capacitação técnica com experiências profissionais em hospitais no Brasil (BP) e nos Estados Unidos (Johns Hopkins Hospital e Cleveland Clinic). Tem MBA em gestão executiva em saúde e é mestrando em epidemiologia.
“Depois de presenciar a atuação de muitos médicos como gestores, entendi que havia a possibilidade de estar em uma área que carecia de mais profissionais com conhecimento das duas realidades, a médica-assistencial e a administrativa”, afirma. “A oportunidade de trabalhar em equipe, abordando questões de acesso, custo, desfecho e experiência dos pacientes em uma escala maior do que atendendo individualmente foi uma importante força impulsionadora [na carreira]”, diz ele, que recebeu cinco propostas de trabalho em 2020 e 2021.
Na opinião de Marcos Neles Anacleto, 57, admitido em abril como diretor executivo da Casa de Saúde São José, da Rede Santa Catarina, um líder do setor precisa estar envolvido com o objetivo da instituição. Graduado em economia e contabilidade, ele trabalha na área médica desde 1979. Como ocupou cargos de diretoria em operadoras de planos e hospitais, consegue analisar melhor os “dois lados” do sistema - das casas de saúde e das fontes pagadoras de serviços. “O que dá uma noção mais ampla das estratégias dos dois negócios”, diz.
Hoje, Anacleto, que comanda equipes com 530 pessoas, precisa alcançar resultados financeiros definidos pelo conselho do hospital e indicar projetos prioritários. Segundo o profissional, o mercado para gestores de saúde permanece aquecido - ele recebeu sete convites de trabalho em 2020 e mais quatro este ano. “Ter iniciativa e liderar pelo exemplo são fatores importantes nesse setor”, afirma.