O sistema de saúde brasileiro enfrenta um desafio constante: como criar modelos de gestão que resistam a crises, aprendam com os erros e sustentem a melhoria contínua? A resposta, segundo especialistas reunidos no Lean Summit 2025, está em construir sistemas robustos e resilientes, capazes de combinar ciência da melhoria, governança sólida e engajamento humano.
“Quanto mais simples e coerente for o sistema, mais confiável ele se torna. Diminuir variação e complexidade é fundamental para reduzir falhas”, afirmou Carlos Frederico Pinto, sênior advisor do Lean Institute Brasil e colunista do Saúde Business, ao abrir o debate no evento.
A experiência internacional mostra que metodologias colaborativas são capazes de acelerar mudanças e gerar impacto sistêmico. Paulo Borem, diretor sênior do Institute for Healthcare Improvement (IHI), ressaltou que atuar de forma isolada não é suficiente.
“Fazer lean em uma organização só não basta. Quando reunimos várias instituições em torno de um mesmo objetivo, criamos uma comunidade em que todos aprendem com os erros e avançam mais rápido”, disse.
No Brasil, o IHI apoiou projetos com resultados expressivos:
Segundo Borem, o segredo está em ciclos rápidos de melhoria, conhecidos como PDSA (Plan, Do, Study, Act), aplicados de forma intensiva pela linha de frente. “Sem alegria não há melhoria. Buscar qualidade na saúde tem o amor como essência”, completou, durante sua fala no evento.
A sustentação de resultados, porém, depende de estruturas sólidas de governança. Para Raquel Anbustre, diretora de acreditação da Quality Global Alliance (QGA), essa é a espinha dorsal de qualquer sistema resiliente.
“Precisamos de governança robusta, porque ela é a base da resiliência”, destacou.
A metodologia internacional Qmentum, adotada pela QGA em parceria com a Accreditation Canada, já está presente em 40 países e envolve mais de 120 mil leitos acreditados. No Brasil, são 20 estados, 20 mil leitos e mais de 400 instituições certificadas ou em processo de acreditação.
Os cinco pilares centrais do modelo são:
Resultados recentes mostram avanços relevantes: em 88 hospitais brasileiros avaliados entre 2023 e 2025, houve evolução média de 12% nos indicadores de maturidade da gestão entre o diagnóstico inicial e a certificação, e de 5% adicionais após a recertificação. Já em serviços de anestesia, o crescimento foi ainda maior: 19% do diagnóstico à certificação e 12% até a segunda recertificação.
“Nem toda mudança é melhoria. Mas, quando a melhoria acontece, ela precisa ser sustentada por governança, pessoas engajadas e processos maduros”, afirmou Raquel.
Um dos exemplos mais emblemáticos foi apresentado por Claudia Garcia de Barros, gerente de Qualidade do Hospital Israelita Albert Einstein e coordenadora do projeto Saúde em Nossas Mãos, que integra o Proadi-SUS.
“Infecções hospitalares são eventos evitáveis, e para nós a meta é zero. Se conseguirmos manter as melhores práticas à beira-leito, evitamos vidas perdidas e desperdício de recursos”, explicou.
Entre 2021 e 2023, o programa mobilizou quase 200 hospitais pelo país, alcançando reduções expressivas em unidades de terapia intensiva:
Os impactos vão além da qualidade assistencial:
“Compartilhamos esses resultados em publicações internacionais porque mostram que é possível combinar excelência assistencial com sustentabilidade financeira”, destacou Claudia durante o Lean Summit 2025.
Mais do que números, os especialistas reforçaram que a transformação cultural é indispensável. Projetos sustentáveis dependem de comunidades de aprendizado em que equipes compartilham práticas, mantêm contato contínuo e se apoiam em propósito comum.
“O que faz de nós uma comunidade é a conexão emocional. Sem ela, não há mudança sustentável”, refletiu Paulo Borem.
No consenso dos especialistas presentes ao Lean Summit 2025, sistemas robustos e resilientes não são apenas meta de gestão, mas condição para a sobrevivência da saúde. Eles dependem de governança clara, metodologias colaborativas e, sobretudo, de profissionais conectados pelo propósito de salvar vidas.