Novas regras para telemedicina devem deslanchar projetos
05/02/2019
A nova resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre a prática da telemedicina - aquela que permite fazer diagnósticos, consultas e até cirurgias a distância - regulamenta algumas práticas que já são adotadas no país e deve fazer novos projetos deslancharem.
Na operadora de plano de saúde Hapvida, a maior do Nordeste, consultas a distância são realizadas há sete anos. São 8 mil por mês, feitas com especialistas como neurologistas, reumatologista e alergologistas, disse o diretor corporativo de telemedicina da operadora, José Luciano Monteiro Cunha. A resolução 2.227/2018, divulgada no domingo à noite e que deverá entrar em vigor em três meses, vai possibilitar a expansão do serviço da Hapvida. "Os próximos passos já estão definidos. A procura pelos pacientes deve aumentar", disse Cunha.

Segundo o executivo, a operadora tem 56 médicos capacitados para exercer a telemedicina. A Hapvida tem 20 clínicas, totalizando 24 salas para esse tipo de atendimento. Todas são equipadas com TV de 40 polegadas, câmera com capacidade para aumentar a imagem em 20 vezes e um sistema de áudio de qualidade. O objetivo é que a interação entre médico e paciente seja a mais clara possível.

Em Belém e São Luís, por exemplo, o cliente da Hapvida pode ser atendido em uma clínica de telemedicina da operadora. O paciente é recebido primeiro por um médico auxiliar, que está na clínica e tem o papel de ajudar a entender o motivo da consulta. Depois, é feito o atendimento com o especialista, a distância.

Desde junho de 2018, o Hospital Sírio-Libanês atua na telemedicina, dando suporte para médicos que atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS). A nova regulamentação do CFM acelera os planos para oferecer a telemedicina a clientes corporativos do hospital como Votorantim e Santander, a partir de maio.

No projeto Regula+Brasil, em parceria com o Ministério da Saúde, o objetivo do Sírio-Libanês é reduzir a fila de consultas com especialistas em Porto Alegre, Distrito Federal e Belo Horizonte. "Os profissionais que atuam na rede pública têm o suporte dos nossos médicos para analisar os prontuários dos pacientes e, se necessário, encaminhá-los para especialistas", disse César Biselli, coordenador de tecnologia e inovação do Sírio-Libanês. Os médicos do SUS ligam para uma central de atendimento e são direcionados para discutir os casos, conforme a especialidade. Até o fim do ano serão adicionadas duas capitais ao programa. No total, o hospital tem 85 médicos capacitados em telemedicina.

"Estávamos aguardando ansiosamente a definição da nova regulamentação. Acredito que a produtividade deve crescer porque quando um paciente não comparecer à consulta, como ocorre em 25% [dos agendamentos], o médico não ficará ocioso, podendo atender a distância", diz Cadri Massuda, presidente do Sindicato Nacional dos Planos de Saúde (Sinamge) e da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge).

Massuda observou que o CFM ficou "um pouco atrasado" em relação a outros países, considerando a prática de telemedicina na América do Norte e na Europa. Ele sugere que as regras no Brasil sejam rediscutidas a cada dois anos.

 
Com o avanço da telemedicina no país, a produtividade dos médicos deve aumentar e os custos para o sistema de saúde devem cair. A opinião é de Francisco Balestrin, presidente da International Hospital Federation e membro do conselho da Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp).

O serviço de consultas médicas feitas remotamente é, para Balestrin, o que tem maior potencial de expansão imediata no Brasil. A partir de agora, devem ser abertas negociações entre médicos e operadoras de planos de saúde para determinar quanto vai custar uma consulta on-line. Será mais barata do que uma consulta presencial? "Pode ser até mais cara", responde Balestrin. O médico precisa ser treinado para fazer um atendimento a distância. O que deve ocorrer também é que, com o tempo, a produtividade desse médico vai aumentar pois ele poderá atender mais pacientes, disse Balestrin.

"O preço por consulta é uma das maiores barreiras da telemedicina no mundo inteiro. Na parceria com o SUS, a cobrança é realizada por meio de um pacote, mas na saúde corporativa, o melhor modelo é o per capita", disse Biselli, do Sírio-Libanês.

Traçar diagnóticos remotamente, em especial a partir de exames por imagem, "já é uma realidade", diz Balestrin, lembrando que a Índia é exemplo mundial. Centrais de diagnósticos na Índia trabalham para hospitais nos Estados Unidos.

A terceira parte da resolução, que trata de cirurgias feitas à distância, deve ter uma implantação mais lenta. O investimento em equipamentos, como os robôs que são comandados pelos médicos remotamente, é alto. E o treinamento do médico também não é barato. Perguntado sobre a telecirurgia, Biselli, do Sírio, disse que existe potencial para crescer nos próximos anos, especialmente quando a internet móvel de quinta geração (5G) estiver instalada.

A nova resolução foi bem aceita pelos aplicativos de consultas médicas. Procurados pelo Valor , Boa Consulta, Dandelin e Doutor 123 informaram que pretendem incorporar o teleatendimento em algum momento. Até agora, eles só podiam intermediar consultas presenciais. "O CFM tem feito um esforço para se adaptar, mas as coisas foram acontecendo e foi passando. E caímos num limbo. Não dizia que não podia, mas não também não havia um liberação formal, o que trazia insegurança e travava algumas iniciativas", disse Maurício Trad, fundador e presidente da Doutor 123.

A resolução 2.227/2018 demorou para ser aprovada devido à complexidade do serviço de telemedicina, disse Donizetti Dimer Giamberardino Filho, membro da câmara técnica de informática em saúde do CFM. O objetivo foi regularizar uma prática que já existe e dar proteção aos dados dos usuários. Os registros de áudio vídeo das consultas precisam ser gravados e arquivados como se fossem um prontuário comum, por 20 anos, tendo a assinatura digital como recurso de segurança.

Esclarecimentos de dúvidas pelos aplicativos de mensagens ou chamadas de vídeo não estão incluídos nas novas regras. A resolução sobre telemedicina número 1.643, de 2002, continha sete artigos e a atual, 23. Entre elas, foi divulgada há um ano, a resolução sobre os aplicativos de saúde.

Segundo Trad, da Doutor 123, ainda é preciso entender melhor a resolução e desenhar o modelo sob o qual a empresa pretende trabalhar antes de oferecer alguma forma de teleatendimento. Ele disse que é necessário fazer alguns ajustes nas regras. "Se é para fazer um atendimento remoto em um local distante, porque tem que ter consentimento por escrito? E dizer que o retorno de 120 dias deveria ser presencial? São coisas que terão que ser ajustadas, ou poderão, simplesmente, não ser seguidas", disse Trad.

Na avaliação de Victorio Braccialli Neto, fundador do Boa Consulta, os planos de saúde podem incentivar os médicos a adotarem o teleatendimento para consultas de retorno, que não são remuneradas. Para Felipe Burattini, presidente da Dandelin, o atendimento a distância não vai substituir as consultas físicas. "Eu não me sentiria bem atendido dependendo do caso. Pode ser mais adequado para uma segunda opinião, por exemplo", disse.
 
Fonte: Valor




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