Sociedade e pacientes engajados
09/12/2019

Por que educar os usuários para um novo modelo e aumentar seu engajamento no cuidado com a própria saúde impacta a sustentabilidade do sistema

Promover o engajamento do paciente no cuidado com sua saúde e tratamento é uma das grandes preocupações do setor. Sem a participação ativa dos usuários, dificilmente será possível alcançar os resultados necessários para diminuira sobrecarga do sistema e reduzir seus custos. Mas o desafio de levar os usuários a trocarem o papel de receptores de cuidados pelo de agentes da própria saúde é complexo e envolve múltiplos aspectos, como mostrou o painel sobre o papel do paciente na gestão da saúde no z- Seminário Sustentabilidade da Saúde pela Inovação, promovido pela Dasa, a maior empresa de medicina diagnostica da América Latina, e pelo jornal Valor Econômico. Participaram da discussão a bacharel em direito Regina Próspero, do Instituto Vidas Raras; Márcia Agosti, gerente de Saúde da GE do Brasil; e Ana Elisa Siqueira, CEO da GSC Integradora de Saúde.

A busca de soluções digitais para melhorar a comunicação com o usuário tem sido um dos caminhos trilhados para fortalecer esse envolvimento. As empresas estão investindo em portais para pacientes com informação em linguagem clara e acessível, aplicativos móveis, mídias sociais, podcast e outros canais baseados em internet. “A pergunta é se essas iniciativas estão atingindo o ponto certo para aumentar o engajamento dos indivíduos no cuidado com a saúde”, observa Regina Próspero, do Instituto Vidas Raras.

Na opinião de Ana Elisa, da GSC, antes de falar em digitalização e informação, existe a necessidade de educar o usuário para um novo modelo, focado na promoção da saúde e na prevenção das doenças, e não apenas no cuidado com a doença. Nesse contexto, a atenção primária ganha maior relevância como porta de entrada do usuário no sistema. Uma das dificuldades a serem enfrentadas é o preconceito em usar a atenção primária, ainda que seja na rede suplementar. “Essa é uma das barreiras que a gente tem que quebrar. Os usuários da saúde suplementar e privada no Brasil estão acostumados a entrar em um modelo de rede aberta, em que vão onde querem, quando e como querem. Mas posso garantir que a experiência de quem aceita ajuda para construir uma jornada multidisciplinar tem sido muito gratificante”, assegura Ana Elisa. Consolidar essa mudança também é fundamental para viabilizar a implementação dos novos modelos de remuneração da saúde por desempenho, e não por serviços.

A GSC atende as maiores operadoras e seguradoras do setor com a missão de coordenar os cuidados em saúde de cerca de 8o mil pessoas. Sua meta é dar suporte ao usuário para gerenciar os seus riscos (estimados a partir dos dados coletados pelas operadoras e por um questionário direto) e melhorar a própria saúde. Quem aceita passa a fazer parte de uma rede de cuidados com enfermeiros, fisioterapeutas e nutricionistas e é incentivado a se consultar com um médico de atenção primária ou generalista. “Esse profissional terá estudado o perfil do paciente e vai orientar os próximos passos para ter mais saúde”, diz a executiva. A abordagem inicial é feita por telefone, chat, aplicativos ou WhatsApp por enfermeiros sediados na empresa, dependendo das características do usuário. “Eu acredito na transformação digital e temos feito essa grande jornada, mas precisa haver um profissional da saúde na outra ponta. Sozinho, o usuário não faz a mudança.”

Na visão de Regina Próspero, defensora dos direitos das pessoas com doenças raras, o engajamento será maior na medida em que os diversos atores do setor somarem esforços para facilitar a jornada dos pacientes, seja na rede pública ou suplementar. Para ela, é essencial otimizar a realização dos diagnósticos de maneira geral e, em especial, das enfermidades raras. “Muitas vezes, as famílias perdem seus entes porque não conseguem fazer o diagnóstico no momento certo. Mudar esse cenário é responsabilidade de todos”, diz Regina. A Organização Mundial da Saúde estima que 8% da população tem enfermidades raras, o que equivale a cerca de 16 milhões de pacientes no Brasil. Atualmente, apenas 3% das doenças raras têm tratamento, em geral feito na rede pública.

O investimento na educação continuada de pediatras para que aprendam a identificar os sintomas mais precocemente é uma das recomendações do Instituto Vidas Raras. “Eles não precisam saber tudo, mas o suficiente para perceber o problema e encaminhar essas crianças a colegas aptos a fechar o diagnóstico.” Outra medida é a valorização dos médicos de família. “Municiados de informações sobre doenças raras, seriam perfeitos para diminuir o tempo que as famílias demoram para ter um diagnóstico, poisem cada ida ao posto de atendimento elas encontram um profissional diferente, o que traz um desgaste emocional e físico desnecessário”, observa.

A compreensão das necessidades das pessoas com doenças raras e, de modo mais amplo, o reconhecimento da diversidade dos pacientes também influenciam o engajamento. “Pessoas com doenças raras são olhadas como se representassem sempre um gasto elevado, mas não é bem assim. Tem que haver uma visão melhor da saúde para oferecer o que seja adequado para cada um. Nem sempre brigamos pelo tratamento medicamentoso, mas sim por qualidade de vida, atendimento multidisciplinar, acolhimento para ter cuidados paliativos com sucesso.” Já a rede suplementar precisa ter profissionais aptos para evitar desperdícios e injustiças. “Os planos precisam se municiar de peritos capacitados para realmente entender quais exames são necessários e quais não são, para evitar gastos excessivos e atender o seu cliente de forma adequada”, afirma Regina. Há também um outro lado a ser manejado em relação aos exames. Regina conta que muitas famílias entram em contato com o instituto em busca de auxílio para fazer exames que nem sempre são os mais indicados, como o sequenciamento do exoma, que analisa todo o genoma humano em busca de mutações associadas a doenças. “Na maioria dos casos, é possível chegar ao diagnóstico com um exame muito mais simples e mais barato. Mas os pacientes estão convencidos de que o exame mais complexo e mais caro é melhor”, observa. Mudar essa mentalidade significa rever conceitos que estão na origem do atual modelo. “O sistema atual se desenvolveu para tratar doenças com os produtos da indústria farmacêutica”, observa Márcia Agosti, da GE. Reorientá-lo para a promoção da saúde é uma meta complexa e que demanda uma ação integrada.

 

Fonte: O Globo




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