Onda de sarampo
13/12/2019

A Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta para um surto planetário de sarampo, com epidemias devastadoras em algumas regiões. Em 2018, 140 mil pessoas morreram, a maioria bebês e crianças com menos de cinco anos, os mais vulneráveis à infecção. Os que escapam à morte sofrem alto risco de complicações, incluindo pneumonia, encefalite e deficiências vitalícias, como lesão cerebral permanente, cegueira ou surdez. O vírus pode ainda danificar a memória do sistema imunológico por meses ou mesmo anos, tornando os sobreviventes vulneráveis a outras doenças letais, como influenza ou diarreia aguda.

“O fato de que qualquer criança morra de uma doença evitável por vacina como o sarampo é um ultraje e um fracasso coletivo na proteção das crianças mais vulneráveis do mundo”, disse Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS. Nos últimos 18 anos estima-se que só a vacinação tenha salvado mais de 23 milhões de vidas. Mas as taxas de vacinação estão estagnadas há uma década. Para impedir surtos, a OMS recomenda 95% de cobertura com duas doses de vacina em uma determinada comunidade. Mas em 2018 apenas 86% das crianças no mundo foram vacinadas e menos de 70% receberam a segunda dose.

Os impactos mais devastadores ocorreram na África negra, onde os índices de vacinação são baixíssimos. Mas seria um erro circunscrever a crise ao subdesenvolvimento. Os Estados Unidos reportaram o maior número de incidências em 25 anos, e quatro países europeus – Reino Unido, Albânia, República Checa e Grécia – perderam seu status de países livres do sarampo.

No Brasil o vírus foi reintroduzido em 2018, sobretudo na Região Norte, infectando 10.326 pessoas e matando 12. Em 2019, segundo o Ministério da Saúde, já foram notificados 53.761 casos suspeitos, dos quais 11.896 foram confirmados. Até agora houve 15 mortes, 14 em São Paulo. O Ministério estima que 9,4 milhões de pessoas de 20 a 29 anos não estão imunizadas ou tomaram apenas uma dose.

O surto global está longe de ser controlado. Ao contrário. Estimativas parciais da OMS, colhidas até meados de novembro, sugerem que as incidências triplicaram em 2019. O quadro é especialmente alarmante porque não decorre apenas de dificuldades de acesso ou de mera ignorância em relação à rotina de vacinação, mas de uma onda obscurantista materializada em campanhas antivacinação que se alastram por todo o mundo.

Em Samoa, por exemplo, os índices de vacinação caíram de 90% em 2013 para 31% em 2018. O resultado é uma epidemia arrasadora que levou a 4 mil infecções e 60 mortes em um país de apenas 200 mil pessoas. A catástrofe é uma evidência dos riscos da propaganda antivacinação, já que a epidemia foi provavelmente originada na Nova Zelândia, onde vivem muitos samoanos, e depois se espalhou para a vizinha Fiji. Como esses dois países têm bons índices de vacinação as incidências foram mínimas.

No mundo inteiro movimentos populistas de variadas estirpes têm disseminado o ceticismo contra as vacinas como um dos ingredientes de seu pacote de desconfianças em relação às autoridades e às “elites” – sejam elas médicos, cientistas ou gestores públicos. Matteo Salvini, líder da Liga italiana, já classificou as vacinas de “inúteis e em muitos casos perigosas”. Assim como Marine Le Pen, na França, ou Heinz-Christian Strache, na Áustria, ele tem advogado contra a vacinação obrigatória em nome da “escolha dos pais”.

Entre os maiores equívocos em relação à vacinação, a OMS aponta convicções fraudulentas como a de que vacinas causam enfermidades e efeitos colaterais danosos; que a maioria das pessoas infectadas foi vacinada; ou que em países onde determinada doença foi eliminada a vacinação é obsoleta. Enquanto não for criada uma vacina contra a estupidez, cada um precisa fazer a sua parte para imunizar a sua própria cabeça e a de seus próximos contra a antivacinação que, ao que tudo indica, será uma das pragas mais letais do mundo nos próximos anos.





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